Naquele
tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Cuidado com os falsos profetas: Eles
vêm até vós vestidos com peles de ovelha, mas por dentro são lobos ferozes. Vós
os conhecereis pelos seus frutos. Por acaso se colhem uvas de espinheiros ou
figos de urtigas? Assim, toda árvore boa produz frutos bons, e toda árvore má,
produz frutos maus. Uma árvore boa não pode dar frutos maus, nem uma árvore má
pode produzir frutos bons. Toda árvore que não dá bons frutos é cortada e
jogada no fogo. Portanto, pelos seus frutos vós os conhecereis”.
No Evangelho de hoje, caminhando para a conclusão
do Sermão da Montanha, Jesus nos ensina a quem devemos dar ouvidos. Diz
Ele: Cuidado com os falsos profetas. Eles vêm até vós vestidos com
peles de ovelha, mas por dentro são lobos ferozes. E qual é o critério para
discernir o verdadeiro do falso profeta? O Senhor acrescenta: Vós os
conhecereis pelos seus frutos. Somos católicos; mas, infelizmente, mesmo
entre nós há certo gosto por coisas extraordinárias, dons proféticos, visões etc.,
o que muitas vezes acaba desviando os fiéis. Deus se revelou a nós em Jesus
Cristo, e o que a Igreja nos ensina? A conservar a verdade e os ensinamentos de
Cristo ao longo dos séculos. Por isso, se ouvimos falar de alguém que tem
visões, recebe revelações privadas, conversa com tal ou qual santo, experimenta
êxtases místicos etc., precisamos ter um critério seguro para saber se isso vem
de Deus ou não. Qual é ele? Antes de tudo, a fidelidade ao dogma da Igreja, ao
ensinamento da Tradição, à fé dos Apóstolos. A Igreja Católica crê que, depois
da morte do último Apóstolo, nada de novo será acrescentado à Revelação divina
antes do Fim dos Tempos, com a segunda vinda de Cristo. É importante ter sempre
uma atitude de fidelidade à Igreja, porque nenhum vidente ou profeta autêntico poderá
dizer novidades. É o primeiro ponto que precisamos ter diante dos olhos.
Se há algo, pois, desse Evangelho que podemos
aplicar em nossas vidas, é o que Jesus diz logo no início: Cuidado,
não nos deixemos levar pela vã curiosidade, uma desordem devida ao pecado
original. Todos temos vontade de comer, e qual é a desordem da fome? A gula.
Todos temos vontade de beber, e qual é a desordem da sede? A embriaguez. Todos
temos vontade de conhecer, e qual é a desordem da inteligência? A vã
curiosidade. É por causa dela que muitos acabam seguindo caminhos mal traçados,
à procura de toda sorte de videntes, aparições, novidades… Tudo começa por uma
curiosidade aparentemente devota: “Não! É Nossa Senhora mesmo quem está
aparecendo!”, o que termina, em muitos casos, abrindo as portas para
influências demoníacas. De fato, não é raro que os “aparicionsitas”, gente
apaixonada por aparições e revelações novas, se deixem atrair por esoterismos e
feitiçarias, cartomantes e leitura de sorte. É a desordem da vã curiosidade.
Deus nos revelou muitas coisas, mas apenas as que necessitamos saber para
sermos salvos. Afinal, Ele quer a nossa confiança, e não satisfazer a nossa
curiosidade. Sim, Deus quer que confiemos nele, por isso não nos revelou tudo o
que gostaríamos de saber. Precisamos confiar; para isso, devemos contentar-nos
com o que Deus houve por bem nos comunicar.
Há ainda outro ponto que devemos levar em conta
neste Evangelho para saber quem tem o carisma divino de revelações ou não. Está
na segunda sentença de Jesus: Vós os conhecereis pelos seus frutos.
É famoso o episódio em que o Papa mandou São Filipe Néri investigar uma freira
conhecida por ter revelações místicas. Obediente ao Papa, São Filipe Néri foi
ver a religiosa, que já contava com muitos discípulos e seguidores devotos,
atraídos por tantas histórias de êxtases místicos e visões. São Filipe Néri,
depois de longa viagem, chegou à casa da “santa” com as botas cobertas de
barro. Ao se encontrar com a suposta vidente, pediu-lhe: “Irmã, trago os
sapatos sujos de lama. A senhora me poderia fazer o favor de os limpar?” A
freira, com olhar de desdém, de nobre perturbada por um reles plebeu, olhou-o
de cima para baixo e respondeu: “Como tu me pedes tal coisa? Não estou
habituada a esse tipo de serviço…”. São Filipe Néri não teve dúvida. Calçou os
sapatos sujos e viajou de volta para Roma. Lá chegando, disse ao Papa: “Sua
Santidade esqueça aquela freira. Ela não é santa de modo algum porque não tem a
virtude básica, que é a humildade”. Pelos frutos os conhecereis, e
o fruto maior que um profeta ou vidente pode mostrar é a santidade, as virtudes
de quem está em contato com as coisas divinas. E o que dissemos com relação aos
curiosos amantes de revelações vale também para os que se apegam muito a seus
próprios dons carismáticos. São João da Cruz adverte que algumas pessoas têm de
fato dons carismáticos, e Deus lhes pode até mesmo revelar algumas coisas; mas
se tais pessoas não cuidarem da virtude nem procurarem a mudança de vida, a
emenda dos costumes — numa palavra, a verdadeira santidade —, então cuidado:
elas podem terminar na feitiçaria, cheias de soberba e vaidade. Quem diz isso é
o próprio Doutor Místico.
Em resumo, qual deve ser a nossa atitude
espiritual? Não dar demasiada atenção a essas coisas. Se porventura recebermos
alguma mensagem de Deus, tenhamos cuidado e discernimento de espíritos, não
acreditando em tudo com excessiva facilidade [1]. Mesmo que tenhamos a
convicção interior de que aquilo é verdadeiro, precisamos, em primeiro lugar, pôr
essas mensagens, profecias e palavras debaixo da provação de Deus, porque é
pelo fruto espiritual que elas dão em nós que iremos saber se
vêm de Deus ou não. A atitude correta, portanto, é a mudança de vida, a emenda
dos costumes, o desapego das coisas deste mundo e a união à cruz de Cristo,
para alcançarmos assim o grau de santidade a que Deus nos chama. Ouçamos com fé
a Revelação que Jesus nos deu. Ele é o verdadeiro Profeta. Mais do que isso:
Ele é a própria Palavra encarnada, Deus feito homem. Permaneçamos na fé de
Cristo transmitida pelos Apóstolos. Assim estaremos construindo nossa casa
sobre rocha firme.
Referências
1. Em sua obra De
revelationibus, visionibus et apparitionibus privatis regulæ tutæ, o Pe.
Eusebius Amort dá, entre outras, as seguintes regras para considerar falsas
supostas revelações ou aparições privadas: “São falsas as revelações […] nas
quais se contém uma única falsidade” (§4, Regra 3); “As
revelações que, em particular, por suas doutrinas ou promessas, dispõem os
pecadores a postergar as penitências não vêm de Deus” (§4, Regra 4);
“As revelações que alargam o caminho para o céu são falsas” (§4, Regra 7);
“As revelações que servem apenas para alimentar a curiosidade, mas não para
emendar a vida, são falsas” (§4, Regra 8); “Se a forma, o
modo, as circunstâncias ou os efeitos da aparição contêm alguma deformidade,
vaidade, soberba ou torpeza, é certo que tal visão vem antes do demônio que de
Deus” (§4, Regra 9); “Se a pessoa a quem se atribuem revelações
tiver maus costumes, sobretudo se for escrava de vícios carnais e cuidados
supérfluos, deve-se julgá-la enganada ou enganadora”. Também são falsas “as
revelações cujo objeto são coisas curiosas ou inúteis” (§4, Regra 11).
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