A devoção a Nossa Senhora sempre fez parte do
Cristianismo. Dom Nelson Francelino, Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro, afirma
que “a devoção a Maria começou com o
próprio Cristianismo”.
Em toda a história da Igreja, vemos que muitos
santos tiveram grande amor a Mãe de Jesus e fervor ao culto a ela. São João
Bosco dizia: “Maria Santíssima sempre me guiou”; Santo Antonino:
“Se Maria é por nós, quem será conta nós?”; Santo Agostinho: “Tudo quanto
pudermos dizer em louvor de Maria Santíssima é pouco em relação ao
que merece por sua dignidade de Mãe de Deus”.
E poderíamos fazer aqui uma lista enorme dos vários
santos e seus dizeres sobre a Virgem Maria.
Tratado da Verdadeira Devoção
Uma devoção em especial, apesar de ser antiga,
ultimamente tem chamado a atenção de muitos jovens. É a consagração pelo
Tratado a Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem, escrito por São Luís Grignion
de Monfort, santo que viveu de 31 de janeiro de 1673 a 28 de abril de 1716.
Um número cada vez maior de pessoas tem considerado
essa devoção muito poderosa, capaz de produzir grandes frutos na alma da pessoa
que a pratica; daí a grande repercussão.
Contudo, algumas pessoas veem muitos exageros na
consagração pelo método do Tratado. Acham que há muito rigor e interpretam essa
devoção como “desencarnada” ou “espiritualoide” – tipo de desvirtuamento da
verdadeira espiritualidade, em que o indivíduo vive quase que totalmente
desconsiderando que é humano, exige de si e dos outros uma “pseudo-perfeição”,
cheia de escrúpulos.
Há mesmo tais exageros na consagração
a Maria pelo Tratado? E o que causa essas objeções?
Não, não há exageros. A intenção de São Luís G.
Monfort é apresentar uma fórmula diferenciada de consagração.
Talvez, alguns termos e frases usados nos escritos
que, mal interpretados, levam as pessoas a terem objeções, medo da consagração.
Vejamos alguns exemplos:
– Há aqueles que dizem que o consagrado não pode
pedir a Maria nem a Jesus nada para si mesmo. Entretanto, veja o que
diz o Tratado: “Uma pessoa, que assim voluntariamente se consagrou e sacrificou
a Jesus Cristo por Maria, já não pode dispor do valor de nenhuma de suas
boas ações. Tudo o que sofre, tudo que pensa, diz e faz de bem pertence
a Maria, para que ela de tudo disponha conforme a vontade e para maior
glória de seu Filho, sem que, entretanto, esta dependência prejudique de modo
algum as obrigações de estado no qual esteja presentemente, ou venha a estar no
futuro: por exemplo, as obrigações de um sacerdote” (art. nº 123).
Perceba que o Tratado não cita que o consagrado não
pode pedir nada para si mesmo, mas que Maria irá dispor dos méritos
da oração, do sacrifício ou das boas obras dessa pessoa, como seu Filho Jesus
bem quiser. Diz respeito a um ato de confiança, em que o consagrado crê
que seus bens espirituais são melhor administrados por Nossa Senhora e Cristo
Jesus, do que por ele mesmo.
Ora, não é algo parecido com isso que nos ensinam
sobre a oração em línguas? “Pois não sabemos o que pedir nem como pedir; é o
próprio Espírito que intercede em nosso favor” (Rm 8, 26), quando nós podemos
pedir como nosso coração deseja, mas que o Espírito Santo pede melhor por nós.
Portanto, o consagrado pode pedir o que quiser, mas
quem decidirá o que é melhor para ele será Jesus. Na verdade, na vida de todos
nós já é assim, pois nós rezamos, mas quem decide quando recebemos e o tamanho
da graça é o céu.
– Outro ponto polêmico é o termo: “Escravo de Nossa
Senhora”.
Em nossos dias, a palavra “escravidão” não soa bem,
mas, nos dias de São Luís G. Monfort, a realidade da escravatura era comum. Não
estou querendo com isso amenizar as ‘barbáries’ do passado e de hoje para
justificar essa devoção, todavia, não conseguiremos interpretar o verdadeiro
sentido de “escravo”, como quis o autor, sem nos desfazermos do conceito
moderno que temos.
Então, o que é ser escravo de Maria?
São Luís nos explica: “Há duas maneiras, aqui na
terra, de alguém pertencer a outrem. São a simples servidão e a escravidão”
(art. Nº 69).
O servo não dá tudo a seu patrão, exige salário,
pode deixar o patrão quando quiser e não confia sua vida ao seu superior (cf.
art. 71).
Já o escravo “põe sua pessoa na posse e dependência
completa [de Maria]” (art. nº 72).
São Luís diz que: “Há três espécies de escravidão: por natureza, por constrangimento e por livre vontade. Por natureza, todas as criaturas são escravas de Deus (Sl 23, 1). Os demônios e os réprobos são escravos por constrangimento; e os justos e os santos o são por livre e espontânea vontade” (art. nº 70). É é essa última forma que o Tratado nos convida.
São Luís diz que: “Há três espécies de escravidão: por natureza, por constrangimento e por livre vontade. Por natureza, todas as criaturas são escravas de Deus (Sl 23, 1). Os demônios e os réprobos são escravos por constrangimento; e os justos e os santos o são por livre e espontânea vontade” (art. nº 70). É é essa última forma que o Tratado nos convida.
Que lindo quando uma pessoa usa de sua livre e
espontânea vontade para assumir um compromisso de amor! Quanto mais a Nossa
Senhora!
– Sobre as correntes e sinais exteriores.
O Tratado ainda propõe usar uma pequena cadeia
de ferro ou material não valioso e desprovida de beleza, seja no braço,
pescoço, tornozelo ou mesmo na cintura, significando a
pertença a Maria.
Sobre este quesito, muitas pessoas reprovam essa
condição, no outro extremo temos os que dizem ser obrigatório o uso de tais
objetos.
Entretanto, consultemos mais uma vez o livro:
“Essas demonstrações exteriores não são, na
verdade, essenciais, e uma pessoa pode bem dispensar, embora tenha abraçado
esta devoção” (art. nº 236).
Ainda que, adiante São Luís, elogie aqueles que
decidem usá-las, a verdade é que a consagração não obriga ninguém a usá-la. Eu
mesmo, não uso, por uma alergia, mas também por não me sentir à vontade para
utilizar, penso que chama muita atenção. Com certeza, Maria não
desmereceu minha entrega a ela por falta de uma corrente!
Eu, como um consagrado, por esse método posso
testemunhar que é um meio de aproximar o devoto de forma particular e única de
Maria.
Não estou afirmando com isso que essa consagração é
melhor ou mais eficaz que outras. Quem sou eu para mensurar isso? Mas
aquilo que São Luís G. Monfort propõe em seus escritos, apesar de não ser uma
vocação específica, é como se fosse um tipo de carisma, que atrai a pessoa de
tal maneira, como nenhuma outra devoção e práticas espirituais podem preencher
seu coração.
O devoto encontra nos preceitos do Tratado uma
identificação com sua alma, uma harmonia com sua pessoa e suas características.
Por isso, não se torna “pesada”.
É um chamado do Céu, assim como nos sentimos
atraídos a sermos devotos de um santo ou outro, nos identificando com sua
história e o jeito de buscar a santidade.
Com toda certeza, digo que não há exageros no
Tratado, o que acontece são más interpretações e pessoas que propagam uma “dureza”
que chama a atenção mais para si e para sua severidade do que verdadeiramente
para a Mãe de Deus e Seu Filho.
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